Pílulas para turbinar o cérebro. Onde estamos e onde podemos chegar?


Já existem no mercado diferentes medicações que têm o poder de melhorar o desempenho de memória e concentração, e os médicos costumam prescrevê-las a pacientes com disfunções neuropsiquiátricas. Entretanto, nos últimos tempos podemos perceber que a prescrição dessas medicações tem sido estendida a outras situações, como é o caso de indivíduos que trabalham em turnos noturnos, militares, e até mesmo a pessoas que simplesmente querem “turbinar” o cérebro para o trabalho, com a intenção de melhorar a atenção e a memória.

Onde é que vamos chegar com isso? Além dos prós e contras dessas medicações sobre nossa saúde no longo prazo, certamente há uma grande questão ética a ser discutida. Tais medicações têm sido cada vez mais usadas em todo o mundo, cada vez em idades mais precoces. Uma recente enquete realizada pela revista britânica Nature envolvendo 1400 leitores (cientistas e estudantes) de 60 diferentes países revelou que 20% das pessoas que responderam à pesquisa já tinham usado medicações com a intenção de melhorar o desempenho cerebral por razões não médicas, 25% desses com consumo diário. O uso não foi diferente entre as diversas faixas etárias, sendo que 50% das pessoas queixaram-se de efeitos colaterais e um terço das pessoas adquiriam as medicações pela internet, sem necessidade de receita médica. Para se ter ideia da complexidade da discussão vejam o que um cientista americano de 66 anos de idade respondeu à pesquisa: “Como cientista, é minha missão usar todas as ferramentas ao meu alcance para o benefício da humanidade. Se essas drogas podem contribuir para esse fim, então é minha tarefa usá-las.”

No consultório de neurologia, frequentemente atendo pessoas querendo uma medicação para esse fim. Recentemente uma paciente que fazia curso preparatório para concurso público disse que o próprio professor, um juiz federal, a orientou a procurar um neurologista com o seguinte apelo: “já existem medicações que podem melhorar seu desempenho”. Posições radicais como “Oh, que horror!” não costumam colaborar muito. É hora sim de aprofundarmos essa discussão com a participação de diversas áreas do conhecimento.

Já existem medicações que permitem que o indivíduo fique até três dias sem dormir e “disposto”, e pouco conhecemos sobre seus efeitos a médio e longo prazo. Será que chegaremos ao ponto de criar políticas antidoping no caso de concursos públicos? Chegaremos a viver numa sociedade que não relaxa e não dorme, já que as vantagens evolutivas da nossa tão falada sociedade da informação são muito mais cerebrais do que musculares e sexuais? Será que os pais ao verem inúmeros colegas de seus filhos usando medicações para o vestibular vão deixar de usar tais hipotéticas armas de competição? É difícil alguém se imaginar cometendo um neurodoping ao consumir 10 xícaras de café por dia nos meses que antecedem um concurso. Com pílulas deveria ser diferente? Será que essas pílulas poderiam nos oferecer mais do que uns cafezinhos durante o dia? Um indivíduo nascido rico e com boa nutrição no seu desenvolvimento tem inequívocas vantagens competitivas do ponto de vista cerebral quando comparado a outro que passou a infância desnutrido. “Medicações espertas” podem um dia contribuir para reduzir as consequências das desigualdades sociais?

A ciência tem muito que investir na avaliação do custo-benefício dessas drogas neuromoduladoras em indivíduos sem queixas ou diagnósticos neuropsiquiátricos. Já existem estudos sendo conduzidos ao redor do mundo, inclusive no Brasil, buscando saber se o uso de antidepressivos usados por indivíduos saudáveis não poderiam deixá-los melhores ainda. Ainda sabemos pouco. E quem disse que as pílulas têm mais poder de provocar alto desempenho cerebral do que uma vida saudável com tudo aquilo que sabemos que faz bem ao cérebro: educação, alimentação e sono adequados, atividade física, equilíbrio emocional, etc. Minha aposta é que as pílulas não ganham a disputa.

Lazer é coisa séria


Muitos de nós já fizemos planos de voltar a curtir as coisas que adorávamos fazer quando tínhamos mais tempo livre, e muitas dessas atividades estão ligadas ao esporte: o futebolzinho com os amigos, caminhar com as amigas, andar de bicicleta, etc. Uma boa parte da enorme lista de benefícios da atividade física regular é do conhecimento de todos e incluem maior longevidade, melhor desempenho cerebral, melhor saúde psíquica e menor risco de doenças vasculares, degenerativas e neoplásicas.

Conhece-se bem menos sobre o impacto do lazer sobre nossa saúde independente da atividade física, como é o caso da leitura, cinema, música, etc. Alguns estudos, entretanto, têm revelado efeitos positivos interessantes.

Pesquisadores suecos demonstraram na década de 90 uma maior longevidade entre pessoas que frequentavam eventos culturais. O mesmo grupo realizou um outro estudo que analisou a relação entre a participação em eventos culturais e o status geral de saúde. Duas entrevistas com intervalo de oito anos entre elas foram aplicadas a 3800 voluntários. Os indivíduos que apresentaram altos escores de participação em atividades culturais apresentavam 65% mais chance de se julgarem saudáveis quando comparados àqueles com baixos escores. Ainda mais importante foi o fato de que aqueles que partiram de um status de baixa atividade cultural na primeira entrevista e passaram a ter uma maior participação na segunda entrevista, atingiram uma auto percepção de saúde semelhante àqueles que apresentavam altos scores em ambas as entrevistas.

As possíveis explicações para os benefícios do lazer sobre nossa saúde incluem desde dimensões psicossociais, até mesmo biológicas. As atividades de lazer podem aumentar nossa rede de relacionamentos, nossas conexões sociais. Esse é um fator que está associado a uma menor concentração de hormônios do estresse e já foi demonstrado que com isso há redução dos riscos de doença isquêmica do coração (os animais de estimação também exercem esse efeito). Além disso, o lazer pode aumentar os níveis do hormônio ocitocina e do neurotransmissor serotonina, ambos associados ao bem-estar psíquico. Uma simples aula de canto é capaz de aumentar os níveis do hormônio ocitocina, hormônio que pode ser considerado como modulador do estresse.

O lazer também promove a estimulação de nossos centros cerebrais de recompensa associados ao prazer. Essas são as mesmas regiões do cérebro estimuladas quando nos deliciamos com um saboroso alimento, quando experimentamos a paixão, quando compramos algo novo e muito desejado, quando temos atitudes altruístas ou quando solucionamos um problema. A ativação desses centros leva à liberação de uma série de neurotransmissores como dopamina, serotonina, endorfina, e que estão associados à sensação de prazer. O lazer é uma das maiores oportunidades para fugirmos da rotina, da repetição. Assim nosso cérebro vivencia o novo e o inesperado, que são fatores críticos para a estimulação de nossos centros de recompensa, com boas repercussões sobre a saúde psíquica e o estado imunológico.

Um meio rico em estímulos promove ainda uma maior saúde de regiões cerebrais tais como o hipocampo, que está relacionado a uma maior atividade cognitiva e menor risco de depressão. Há uma forte linha de pesquisa mostrando-nos que os idosos que mantêm ativas suas atividades de lazer têm menos risco de desenvolver a Doença de Alzheimer.

Diferentes modalidades de lazer também têm sido demonstradas como ferramentas preciosas para o tratamento de pessoas doentes: música, literatura, teatro e pintura. A música, por exemplo, aumenta a velocidade de recuperação de pacientes na fase aguda de um derrame cerebral, reduz a agitação de adultos em unidades de terapia intensiva e melhora o comportamento de crianças internadas com transtornos psiquiátricos.

O lazer tem sido levado cada vez mais a sério, e não devemos achar que sua importância seja restrita a sociedades superdesenvolvidas como o Estado de bem-estar social sueco. No Brasil ainda temos que suar muito a camisa para alcançarmos padrões mínimos desejáveis de desenvolvimento social, e estamos melhorando. O lazer associado ou não ao esporte pode ajudar a alavancar ainda mais esse desenvolvimento. Do ponto de vista de política pública, o lazer é um investimento relativamente barato com frutos em várias dimensões do desenvolvimento humano: saúde é só uma delas!

Pode acreditar. A fé é uma grande aliada da saúde


Alguns enxergam a religiosidade simplesmente como uma forma de controle social, algo maior vigiando o comportamento humano. Outra forma de entendê-la é pensar que a evolução da espécie humana favoreceu a experiência religiosa como um mecanismo que ajuda a manter comunidades unidas e também a promover um melhor autocontrole mental. A princípio, quando uma meta é encarada como sagrada, o indivíduo teria maior tendência em se esforçar para alcançá-la. Mais do que isso, o sagrado abastece a mente humana no desafio de pensar sobre a vida e a morte, e em tempos mais remotos, era fundamental para o entendimento dos sonhos e fenômenos da natureza.

Marx, Freud, Weber, entre tantos outros, defenderam a ideia de que a modernidade reduziria a influência das crenças religiosas na sociedade. No Brasil, nos últimos 20 anos, houve um discreto aumento na porcentagem de brasileiros que dizem não ter uma religião: em 1991 essa cifra era de 4.75% e em 2009 passou para 6.7%. Entretanto, é notório que a humanidade continua com altos índices de religiosidade.

A religiosidade tem seu lugar no cérebro? A neurociência tem demonstrado que a experiência religiosa estimula circuitos cerebrais do neurotransmissor dopamina, os mesmos circuitos que são considerados disfuncionais em transtornos neuropsiquiátricos em que a hiperreligiosidade faz parte do quadro clínico, como é o caso da epilepsia do lobo temporal, esquizofrenia, mania e transtorno obsessivo-compulsivo. Sistemas cerebrais da serotonina também parecem estar implicados, já que drogas que têm influência sobre eles são facilitadoras da experiência religiosa. Entre essas drogas podemos citar o LSD, mescalina, ecstasy, e o chá de Ayahuasca utilizado pelo Santo Daime e União do Vegetal.

Quando pensamos na influência da fé na evolução de problemas de saúde, vale a pena refletir sobre o poder do efeito placebo. A origem do termo é o verbo placere do latim que significa AGRADAREI.  A simples expectativa positiva de que um tratamento pode nos fazer bem já é capaz de provocar mudanças fisiológicas em nosso corpo, e esse é o chamado efeito placebo. Pessoas que apresentam boa resposta ao placebo apresentam circuitos cerebrais de dopamina com maiores concentrações desse neurotransmissor. Também há evidências de que as concentrações dos opioides endógenos e de serotonina são influenciadas pela expectativa positiva. Isso tudo pode ter repercussões sobre o sistema imunológico e favorecer a evolução de uma condição de saúde. Se uma pílula de farinha já é capaz de provocar esses efeitos, podemos tentar imaginar o que a prece ou um ritual religioso pode promover. Esse é um modelo que a ciência tem para explicar os efeitos da fé sobre a mente e o corpo. Isso não quer dizer que outros mecanismos ainda intangíveis não possam ser descritos no futuro.

A religiosidade faz bem mesmo à saúde? Já temos um razoável corpo de evidências que indivíduos com uma maior vivência religiosa / espiritual têm uma maior capacidade de lidar com o estresse emocional, uma melhor saúde mental de forma geral e, em situações de doença, cooperam mais com o tratamento. Além disso, o envolvimento com uma comunidade religiosa está associado a uma maior rede social, e há tempos sabemos que pessoas socialmente integradas têm menos chance de adoecer, e quando doentes, a rede social é uma das principais fontes de apoio. Esse pode ser um dos principais fatores que explicam resultados de maior longevidade entre as pessoas com maior religiosidade. Assume-se também que essas pessoas têm a tendência a apresentar hábitos de vida mais saudáveis.

Entretanto, as crenças religiosas nem sempre estão a favor da saúde do paciente, já que podem em alguns casos dificultar a aderência ao tratamento com idéias do tipo: esse é o desejo de Deus; Deus me abandonou; esse é o meu destino; esse é o meu castigo; etc. Em situações como essas, é bem razoável que a equipe de saúde esteja minimamente preparada para abordar dimensões religiosas / espirituais do paciente e assim aumentar a aderência e sucesso do tratamento.

A abordagem da religiosidade de um paciente não precisa ser um bicho de sete cabeças. Algumas doenças podem ter um efeito devastador na vida de um paciente e suas famílias, especialmente no caso do câncer e de doenças degenerativas e progressivas como a Doença de Alzheimer. Perguntas comuns nessas situações como Por que comigo? Por que com meu filho? Por que isso tudo? dão-nos uma pista de que, além dos cuidados físicos, cognitivos e emocionais, uma janela preciosa na relação  entre a equipe de saúde  e o paciente e seus familiares pode estar se abrindo: a dimensão espiritual.

Estudos revelam que mais de 90% dos médicos acreditam que a religiosidade dos pacientes deve ser considerada. Entretanto, apenas 30% dos médicos acreditam que isso deve ser efetivamente abordado, e só 10% adotam essa prática, mesmo entre pacientes terminais. Por outro lado, sabemos também que são bastante ruins os indicadores que medem a satisfação de pacientes quanto ao cuidado dispensado pela equipe de saúde aos seus aspectos emocionais e espirituais.

As pessoas com maior religiosidade são mais felizes? Já é bem reconhecido que a percepção do quanto nos sentimos felizes é influenciada pelo quanto exercitamos algumas dimensões de nossa experiência humana como a gratidão, gentileza, altruísmo e otimismo. Difícil discordar que a prática religiosa seja uma inestimável ferramenta para exercitar essas virtudes. Além disso, a dedicação a algo maior do que si próprio, a sensação de significado na vida e de fazer parte do todo, são condições que estão associadas à auto percepção de felicidade e, mais uma vez, a religiosidade é uma das principais formas para se vivenciar essas experiências.

Insônia é coisa séria


Insônia é um problema muito frequente e chega a acometer até 10% da população. A insônia está associada a um maior risco de diversas condições clínicas como hipertensão arterial, diabetes, infarto do coração, insuficiência cardíaca, depressão, ansiedade, abuso de álcool e outras drogas, e também a uma maior mortalidade. Além disso, as repercussões econômicas da insônia não são nada desprezíveis, já que limita a produtividade no trabalho e resulta em maiores níveis de absenteísmo.

Você dorme bem? Difícil discordar que essa é uma pergunta que não pode faltar em uma consulta médica.

Dez dicas para uma boa noite de sono:

1- Fixar um horário certo de ir para a cama e de acordar;

2- Ir para a cama só quando estiver com sono;

3- Evitar dormir durante o dia;

4- Evitar atividades na cama que não sejam a de dormir e ter relações sexuais;

5- Evitar passar tempo excessivo na cama tentando dormir. Quando não se consegue dormir, é preferível levantar e sair do quarto até que volte a sentir sono;

6- Evitar o consumo de bebidas alcoólicas por no mínimo 6 horas antes de dormir. O álcool pode alterar a arquitetura do sono e aumentar o número de apneias nos portadores de apneia obstrutiva do sono;

7- Evitar refeições pesadas antes de dormir e evitar o uso de bebidas estimulantes como café, chá preto, verde ou mate e energéticos por no mínimo 6 horas antes de dormir;

8- Praticar exercícios físicos regularmente, evitando fazê-los próximos ao horário de dormir;

9- Procurar relaxar física e mentalmente pelo menos 2 horas antes de dormir. Um bom hábito é ter uma agenda para escrever os compromissos e prioridades do dia seguinte para que se possa ir para a cama sem se preocupar com aquilo que não se deve esquecer no dia seguinte;

10- Melhorar o ambiente do sono. O quarto em que se dorme deve ser confortável, silencioso, escuro e com temperatura adequada. Para as pessoas que tem alergia, carpetes ou outros materiais que acumulem poeira devem ser evitados.

Afinal, devemos dormir quantas horas por dia?


O sono é tão importante como é a comida e o ar que respiramos. E o sono não é privilégio da espécie humana ou dos mamíferos. Comportamentos semelhantes ao sono podem ser observados em invertebrados, anfíbios, e algumas espécies de peixes e aves. A quota de sono diário é muito variada entre as diferentes espécies, chegando a 20 horas por dia entre os morcegos, até o curioso comportamento dos golfinhos que nunca dormem completamente: um lado do cérebro “dorme” do ponto de vista eletrofisiológico, e até fecham um dos olhos, enquanto o outro lado permanece em vigília permitindo que continuem nadando e navegando.

Das diversas funções atribuídas ao sono, as mais estudadas e legitimadas são a recuperação e conservação de energia, consolidação do que aprendemos durante o dia e processamento afetivo. Mas por que não foram desenvolvidos outros mecanismos cerebrais para fazer o papel do sono sem a necessidade de se perder o controle do ambiente que nos cerca? Do ponto de vista evolutivo, o sono pode até ser considerado um comportamento de risco, já que reduz a capacidade de regulação térmica do organismo e diminui também a capacidade de escapar de um predador. Entretanto, a natureza foi sábia e o sono evoluiu para uma sequência de diferentes estados de profundidade, os estágios do sono, o que permite que ele cumpra seu importante papel fisiológico sem impedir nossa capacidade de detectar situações de risco ao nosso redor. Quando dormimos, não estamos em coma. Passamos apenas uns 20% do tempo de sono nos seus estágios mais profundos.

A imagem de nossos ancestrais dormindo em grupo, protegidos numa caverna e sob o calor do fogo, é uma forma de lembrarmos que para dormirmos bem precisamos perceber segurança. No mundo moderno, o que nos deixa inseguros não são animais selvagens, e é aí que o estresse entra em cena como um dos principais fatores associados a um sono ineficiente. A sensação de insegurança social ou material pode ser comparada a um predador que ronda nosso sono. Até o noticiário nas TVs não deixa de ser uma forma de ameaça.

Quando por tempo limitado, o estresse é um mecanismo fisiológico fundamental, pois ele nos permite estar mais aptos a enfrentar os desafios. É ele que nos ajuda a sentir menos a privação de sono quando precisamos dormir menos, como por exemplo, quando temos que terminar um trabalho com data marcada. E nisso o cérebro é razoavelmente flexível. Ele nos permite “dever“ um pouco de sono por alguns dias sem grandes prejuízos, mas 5 a 6 dias de dívida já são capazes de induzir alterações metabólicas e endócrinas que podem contribuir para o desenvolvimento de doenças como o diabetes, hipertensão arterial e obesidade. Isso sem falar na redução do desempenho cognitivo e maior risco de acidentes.

É fato que precisamos dormir muito menos do que o período em que o céu fica escuro, pelo menos aqui nos trópicos em que a relação noite / dia é mais equilibrada. O número ideal de horas de sono é aquele que faz com que a pessoa no outro dia sinta que dormiu o suficiente. Existe um senso comum que 8 horas de sono é o mais recomendável. Será? Existe um percentual pequeno de pessoas, que se sente bem com menos de 7 horas, também chamados de dormidores curtos. Há também os dormidores longos, aqueles que precisam de mais de 8 horas de sono. Porém, a maioria da população, incluindo os brasileiros, dorme entre 7 e 8 horas por noite. Dorme-se um pouco menos na 4ª e 5ª décadas de vida e um pouco mais na velhice e infância, e ainda há evidências de que o ritmo do mundo moderno nos tem feito dormir menos. Moradores de São Paulo em 1987 dormiam uma média de 8 horas por noite, e em 1995, 7.7 horas. Sem a pressão do dia a dia das grandes cidades, talvez dormíssemos mais. Uma pesquisa conduzida na aldeia dos índios Terena no Mato Grosso do Sul mostrou que eles dormem em média 8.5 horas por noite, e um terço deles ainda fazem uma sesta após o almoço diariamente.

Vários estudos foram desenvolvidos nas últimas décadas tentando responder à pergunta de qual é o número ideal de horas de sono para nossa saúde. Alguns estudos populacionais inicialmente demonstraram que o hábito de dormir entre 7 e 8 horas por noite estava associado a uma menor mortalidade do que dormir menos de 7 horas ou dormir mais de 8 horas. O mais provocativo nos estudos iniciais foi que indivíduos que dormiam mais de 8 horas tinham menos longevidade do que aqueles que dormiam menos de 7 horas. E por que dormir mais poderia trazer prejuízo à saúde? A melhor hipótese para explicar esses resultados é a de que a relação causa-efeito não seja: dormir mais prejudica a saúde. Seria o contrário: indivíduos que dormem mais têm mais chance de ter problemas de saúde que os fazem ter esse comportamento

E os estudos mais recentes apontam cada vez mais que essa segunda hipótese seja a mais provável. Além disso, um grande estudo populacional americano publicado em 2007 (Estudo ATUS) foi ainda mais fundo ao mostrar que os indivíduos que dormiam menos de 7.5h dedicavam mais tempo ao lazer e atividades sociais e de relaxamento. Já aqueles que dormiam menos que 5.5h e mais que 8.5h passavam mais tempo em frente à TV.
Esse conjunto de evidências permite-nos dizer que dormir entre 7 e 8 horas por noite é um bom negócio para a maioria das pessoas. Vale lembrar que quantidade de sono deve vir acompanhada também de qualidade, e por isso devemos investir muito em nossa saúde psíquica e orgânica, pois nosso sono costuma mesmo reclamar quando não damos a devida atenção às nossas vidas.

Nosso cérebro não vê sentido em viver sem atividade física


Já é bem reconhecido que a prática de exercícios físicos está associada a um menor risco de doenças cardiovasculares (infarto do coração e derrame cerebral), de alguns tipos de câncer (ex: mama, coloretal), transtornos mentais (ex: depressão, ansiedade), e está associada também a uma maior longevidade. Se tivermos que escolher uma única atitude saudável na vida para alcançarmos a longevidade com qualidade de vida, a prática regular de exercícios aeróbicos talvez seja a mais significativa.

Para se ter ideia do tamanho do efeito da atividade física aeróbica sobre a longevidade vale a pena conhecer os resultados de um dos mais robustos e recentes estudos sobre o tema publicado em 2008. A pesquisa foi iniciada em 1984 quando mais de 500 membros de uma associação de corredores de rua com mais de 50 anos de idade passaram a ser acompanhados anualmente. O grupo de corredores foi comparado a um grupo controle de semelhante faixa etária. Ao final de 21 anos de acompanhamento os resultados foram os seguintes: 1) a atividade física entre os corredores foi cerca de três vezes mais intensa ao longo de todo o estudo; 2) houve declínio da capacidade funcional ao longo dos anos em ambos os grupos, mas de forma menos relevante entre os corredores; 3) após 19 anos de acompanhamento, 34% dos indivíduos do grupo controle havia morrido, comparado a apenas 15% dos corredores; 4) os corredores apresentaram menor mortalidade não só por doenças cardiovasculares, mas também por câncer.

Como se isso tudo já não fosse o bastante, a cada dia temos mais evidências de que o cérebro também lucra com o hábito da atividade física regular. E o benefício ao cérebro já começa em idades precoces. Pesquisas demonstram que é maior o desempenho intelectual de crianças e adolescentes que praticam atividade física regular. Ao contrário do que já se chegou a cogitar, o tempo gasto com atividade física na escola promove mais sucesso acadêmico do que se o jovem direcionasse esse tempo de atividade física para mais atividades na sala de aula.

Os efeitos da atividade física também têm sido muito bem estudados no processo de envelhecimento cerebral sugerindo um efeito neuroprotetor. Uma série de pesquisas tem revelado que a atividade física em idosos melhora o desempenho cognitivo e os efeitos positivos podem ser observados em diversas dimensões da cognição e de forma mais marcante sobre as funções executivas que incluem, por exemplo, a memória operacional (de curto prazo), a capacidade de planejamento, de tomada de decisão e de dar atenção a mais de uma coisa ao mesmo tempo. Já dispomos também de um bom corpo de evidências de que a atividade física em idosos reduz o risco de desenvolver a Doença de Alzheimer e a Demência Vascular, ou pelo menos adia seu aparecimento.Os efeitos positivos da atividade física sobre o cérebro também já foram demonstrados através de variáveis fisiológicas que vão desde o aumento da perfusão sanguínea, metabolismo e tamanho do cérebro em determinadas regiões, até a modulação de sua própria atividade elétrica. Em animais as pesquisas chegam ao nível celular e molecular. Ratinhos que se exercitam criam novos neurônios e conexões em uma das regiões mais importantes do cérebro no que se refere à memória: o hipocampo. Novos vasos sanguíneos também são criados no hipocampo assim como em outras regiões cerebrais. O exercício estimula também a produção do Fator Neurotrófico Derivado do Cérebro, e isso já foi demonstrado também em humanos, que é responsável pela saúde dos neurônios e está associado à capacidade de aprendizado e memória. Até mesmo ratinhos recém-nascidos de mães que se exercitaram durante a gravidez têm mais neurônios no hipocampo do que aqueles de mães sedentárias. Para quem não sabe, uma das primeiras regiões cerebrais afetadas pela Doença de Alzheimer é o hipocampo, doença que promove redução do número de neurônios dessa região. Teoricamente, um indivíduo que se exercita, mesmo que desenvolva a Doença de Alzheimer, deve demorar mais para começar a apresentar sintomas já que tem uma reserva cerebral maior.

O exercício físico ainda é capaz de promover ativação de secreção de diversas substâncias no cérebro como endorfina e endocanabinoides, que podem provocar além do efeito imediato de euforia e redução da percepção de dor, também uma modulação do funcionamento químico do cérebro de forma mais sustentada. Essa é uma das formas de explicar resultados de pesquisas que mostram que a atividade física tem o poder de reduzir a chance de uma pessoa vir a desenvolver depressão. O interessante desses estudos é que esse poder é bem mais robusto no caso da atividade física associada ao lazer do que associada ao trabalho. Sabemos que o lazer, independente de estarmos nos mexendo, por si só já é capaz de recompensar quimicamente o cérebro levando ao bem-estar psíquico, e um dos componentes que ajudam a ativar esse bem-estar é a interação social que boa parte das atividades de esporte e lazer promove.

Desde a Grécia antiga defende-se a ideia de interdependência entre a mente e o corpo. Disse o romano Marcus Tullius Cícero por volta de 65 AC: “É o exercício físico que sustenta o espírito e mantém o vigor da mente”. Hoje não se faz mais o mesmo tanto de atividade física como antigamente e a redução foi mais drástica a partir da revolução industrial quando trabalho deixou de significar esforço físico. O fato é que nem nosso corpo nem nossa mente estão geneticamente adaptados para viver sem atividade física e essa é uma das principais explicações para o aumento da incidência de doenças crônicas como a obesidade e o diabetes, e que passam a acometer as pessoas em idades cada vez mais precoces.

Entre tantas questões que a ciência moderna ainda deve responder temos a seguinte: para o cérebro, qual o melhor tipo, intensidade, frequência e duração de exercício? Ao pensar em nossa saúde como um todo, podemos nos guiar pela atual recomendação de pelo menos 30 minutos de atividade moderada cinco vezes por semana. O que é atividade moderada? Atividade que dá até para fazer conversando, mas que aumenta a frequência cardíaca e faz suar a camisa!

Passando a limpo a T.P.M.. Suas origens e soluções


É no mínimo intrigante quando nos deparamos com resultados de pesquisas no Brasil e no exterior mostrando que até 90% das mulheres sofre de algum grau de tensão pré-menstrual, problema que hoje é mais corretamente chamado de síndrome pré-menstrual (SPM), pelo fato dos sintomas não se limitarem à tensão nervosa, ansiedade e irritabilidade. Outros sintomas comuns incluem alterações no padrão de sono e do apetite, humor deprimido, dor de cabeça, inchaço no corpo e dor na mama.

Não é difícil reconhecer o impacto da SPM na vida das mulheres se fizermos uma conta curiosa. A menstruação costuma começar entre os 12 e 13 anos de idade e termina por volta dos 50 anos. Mesmo descontando dois anos sem menstruação em mulheres que têm dois filhos ao longo da vida, contando com o período de amamentação, a mulher experimentará cerca de 450 ciclos menstruais na sua fase fértil. Se considerarmos que os sintomas da SPM duram uma média de 6 a 7 dias por ciclo, fechamos nossa conta com quase 3000 dias de sintomas durante a vida: oito anos! Resumindo: as mulheres com SPM passam mais de 10% suas vidas com sintomas.

E sendo a SPM uma condição tão frequente, admite-se que ela possa representar uma vantagem evolutiva que as mulheres herdaram de seus ancestrais e que talvez já não sirva mais para muita coisa. Nossos ancestrais fêmeas aumentavam suas chances de gerar descendentes devido a um comportamento mais “amigável” na fase fértil e mais “arisco” na fase infértil, como é o caso do período pré-menstrual. Entre os primatas, que apresentam comportamento sexual promíscuo, essa estratégia permite que o macho escolha a fêmea com mais sinais de fertilidade para copular.

Comparadas a mulheres de sociedades coletoras / caçadoras, as mulheres de hoje têm a primeira menstruação quase quatro anos mais cedo, têm menos filhos, sendo o primeiro em idade mais avançada, períodos de aleitamento mais curtos e ainda apresentam a menopausa mais tardiamente. Tudo isso leva a mulher moderna a apresentar três vezes mais ciclos menstruais do que a mulher em ambiente mais primitivo, e a princípio, pode sofrer até três vezes mais com os sintomas da SPM ao longo da vida.

Na maioria dos casos, os sintomas da SPM são leves a moderados, e em cerca de 5-8% dos casos, os sintomas adquirem sua forma e apresentação mais severa, também chamado de transtorno disfórico pré-menstrual. Nesses casos a mulher apresenta sintomas com significativo impacto no seu trabalho / escola, atividades sociais ou relacionamentos afetivos.

O cérebro está cheio de receptores aos hormônios sexuais em regiões que regulam o comportamento e as emoções, como é o caso da amígdala e o hipotálamo. Entende-se atualmente que mulheres com SPM têm uma maior sensibilidade cerebral às flutuações hormonais que ocorrem durante o ciclo menstrual, podendo influenciar a liberação de neurotransmissores envolvidos na regulação do humor, comportamento e funções cognitivas, especialmente a serotonina. Sabemos que os sistemas de serotonina são capazes de modular os efeitos comportamentais dos hormônios sexuais (ex: agressividade), fato bem apoiado pelo efeito positivo de medicações que elevam os níveis de serotonina em mulheres com SPM. Além disso, sistemas hormonais que controlam a concentração de água e eletrólitos no corpo também podem ser influenciados pela flutuação hormonal, o que poderia explicar os sintomas de inchaço. Entretanto, esse ainda é um tema bem controverso.

Há muito que se fazer para reduzir o impacto da SPM no dia-a-dia. Estratégias medicamentosas é que não faltam, passando por suplementação de cálcio, magnésio, vitamina B6, intervenções hormonais, e antidepressivos que aumentam as concentrações de serotonina (tanto de forma contínua ou só na segunda metade do ciclo). Além disso, medidas comportamentais são bem-vindas, tais como atividade física e técnicas de relaxamento. Quanto à dieta, é frequente a recomendação de restrição de calorias e fracionamento da dieta, mas não há evidências científicas suficientes para “prescrevermos” uma dieta específica. Além disso, estudos com dietas com alto teor de carboidratos complexos sugerem benefícios às mulheres com SPM, talvez por aumento nas concentrações cerebrais de serotonina. É a história do chocolate como melhor amigo da mulher na fase pré-menstrual…

O que Darwin e Freud nos diriam sobre amor e paixão nos dias de hoje ?


Com o objetivo de perpetuação da espécie, é bem compreensível que nosso cérebro tenha se desenvolvido para ser recompensado com tempestades neuroquímicas de prazer ao experimentarmos atração sexual por outra pessoa. Hoje em dia já conhecemos muito dos atributos que aumentam as chances das pessoas se atraírem sexualmente e que vão além de fatores culturais. Os atributos estéticos da pessoa são bastante determinantes, mas outros fatores como cheiro, tom de voz, status social e financeiro, senso de humor, inteligência, todos esses já foram demonstrados como fatores que influenciam a atração sexual, alguns desses mais relevantes para as mulheres enquanto outros para os homens. Já sabemos que por trás dessas preferências há uma mãozinha do nosso código genético.

Quanto maior a diferença entre os DNAs de duas pessoas, maior a chance de atração sexual. Do ponto de vista evolutivo isso faz sentido, pois a reprodução sexuada tem por princípio básico a mistura de genes, diminuindo assim o risco de doenças geneticamente determinadas. Isso ajuda a explicar porque evitamos gerar filhos dentro da própria família. Evitamos o incesto não só por questões culturais ou religiosas, mas nosso cérebro tem atração sexual por pessoas que estão longe do núcleo familiar, pois estas têm maior chance de possuírem um repertório genético distinto do nosso. Num famoso estudo, também chamado de experimento da camiseta suada, mulheres cheiravam várias camisetas masculinas suadas e tinham que eleger a que tinha cheiro mais sensual. Elas elegeram o cheiro de homens com os DNAs mais diferentes dos delas. Uma evidência de que esse é um comportamento que herdamos de nossos ancestrais é o fato de que, ao contrário do que muitos pensam, o incesto é muito raro em grande parte das espécies animais. Freud e Darwin não tinham esse conhecimento em mãos, já que os primeiros estudos sobre a evitação do incesto em animais apareceram apenas entre 1960 e 1970, incluindo primatas, baleias e até roedores.

Imaginem se Darwin e Freud tivessem o conhecimento que temos hoje sobre nossas respostas cerebrais à atração sexual e à presença da pessoa amada. As regiões cerebrais ativadas em resposta a sentimentos românticos ou à atração sexual são muito parecidas, e envolvem o mesmo sistema de recompensa cerebral disparado ao nos deliciarmos com um alimento saboroso. Os principais combustíveis dessas reações são a dopamina, ocitocina e vasopressina, sendo que esses dois últimos não participam das reações observadas no amor materno, e esse é um dos pilares que explicam a diferença entre o amor romântico e o materno. Além das regiões do cérebro que se “acendem” com as experiências do amor romântico ou atração sexual, sabemos também que outras áreas se “apagam”, e essas são regiões vinculadas à função do medo (amígdala) e regiões associadas à nossa crítica, juízo de valores, nosso “superego” (ex: lobo frontal). Isso explica em parte por que o amor é cego, e a paixão nem se fala.

E a monogamia? Há espécies animais, especialmente mamíferos e aves, que preferem continuar com seu parceiro original, mesmo com a oferta de novos parceiros. Esse comportamento é acompanhado de mútua defesa de território e de providência de alimento, e até mesmo de ansiedade à separação. Isso é regado por muita química cerebral e mais uma vez com a participação da dopamina, o neurotransmissor mais associado ao fenômeno de recompensa e ao vício em drogas.  Essa ligação mais duradoura com o parceiro é vista como uma vantagem evolutiva, já que permite que o casal cumpra as tarefas da maternidade e paternidade por tempo suficiente para que a cria tenha mais chance de sucesso de alcançar a idade reprodutiva. Devemos pensar que entre os humanos a monogamia é algo absolutamente cultural e religiosa? Não somos mamíferos tão diferentes assim. Sabemos que entre nós a dopamina transborda com a atração sexual e a experiência romântica, mas também com o processo de ligação mais estável com o parceiro. E vocês acham que Caetano Veloso exagerou na letra de MEU BEM, MEU MAL? “Você é meu caminho, meu vinho, meu vício…”

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