Um bom senso de humor favorece a saúde da mente e do corpo

Estudos avaliaram que o o impacto do humor sobre a saúde dedicaram-se principalmente aos temas dor, estado imunológico e saúde cardiovascular

Por Dr. Ricardo Afonso Teixeira*

É difícil pensar em alguém que não se sinta bem após uma sessão de gargalhadas. Mas será que além do bem estar que o riso provoca, ele realmente faz bem à saúde? O velho ditado de que rir é o melhor remédio tem algum fundamento? Podemos explorar os efeitos do humor sobre nossa saúde sob três diferentes ângulos.

1 – O ato de rir provoca mudanças fisiológicas no corpo e um estado emocional que podem ser positivos ao estado de saúde.

Estudos que avaliaram o impacto do humor sobre a saúde dedicaram-se principalmente aos temas dor, estado imunológico e saúde cardiovascular. Alguns experimentos apontaram que indivíduos são mais capazes de suportar estímulos dolorosos quando estão assistindo a vídeos com conteúdo de humor. Outros avaliaram componentes do sistema imunológico antes e depois de uma sessão de vídeo com conteúdo de humor e os resultados revelaram respostas imunológicas positivas. Quanto ao sistema cardiovascular, pesquisadores demonstraram que pacientes com doença coronariana têm menores scores numa escala de senso de humor frente a situações do cotidiano. Na verdade, temos boas evidências de que a falta de senso de humor, ou uma vida acompanhada de impaciência, raiva e atitudes hostis, estão associadas a um maior risco de desenvolver pressão alta, piorar o controle dos níveis de glicose e ainda aumentar o risco de doença isquêmica do coração e morte.

Não se pode dizer até o momento que são definitivos os resultados das pesquisas sobre o impacto do humor em nossa saúde, pois ainda existem controvérsias. Entretanto, há bons indícios que há uma ligação entre a emoção humana e nosso estado imunológico e cardiovascular, assim como nossa capacidade de perceber a dor. Se o humor faz bem à mente, já é meio passo dado para fazer bem ao corpo.

2 – O humor pode modular os efeitos adversos do estresse.

Qualquer emoção intensa é capaz de ativar o sistema nervoso simpático, que por sua vez libera uma série de “combustíveis” no sangue, entre eles a adrenalina, para que estejamos prontos a enfrentar ou a fugir da situação que nos provocou emoção. Uma pesquisa que comparou os efeitos fisiológicos durante um filme triste e um filme de humor revelou que ambos eram capazes de estimular o sistema nervoso simpático, mas provocaram respostas diferentes no quesito pressão arterial. O filme triste aumentava a pressão arterial dos voluntários enquanto o filme de humor não. Um outro estudo comparou os níveis de hormônios de estresse antes e depois de assistir a um vídeo de humor e mostrou uma redução dos níveis de cortisol, hormônio do crescimento e de um metabólito da dopamina. Não houve aumento dos níveis de endorfina, contrariando a crença de que rir faz bem porque aumenta os níveis desse hormônio. Talvez a dopamina tenha muito mais a ver com o riso, já que é o neurotransmissor dominante no sistema de recompensa cerebral.

Há evidências de que o humor pode ser um bom remédio contra a ansiedade. Um interessante experimento propôs aos voluntários que eles receberiam um pequeno choque a qualquer momento. Uma parte dos indivíduos estudados apenas esperou pelo choque, outra parte esperou ouvindo um áudio sem conteúdo humorístico e um terceiro grupo esperou pelo choque ouvindo um áudio com conteúdo de humor. O áudio de humor foi capaz de reduzir a ansiedade antecipatória ao choque e o efeito foi mais robusto entre os indivíduos com maior senso de humor. Além disso, há evidências de que após uma boa sessão de riso temos o relaxamento de grupos musculares e redução da excitabilidade da medula espinal, efeito que pode durar por mais de meia hora.

3 – O humor tem o potencial de incrementar a rede de relacionamentos de um indivíduo, promovendo maior apoio social.

O bom senso de humor de uma pessoa está associado a outras virtudes que facilitam as relações sociais, como é o caso da empatia, capacidade de se relacionar com intimidade e confiança interpessoal. Além disso, temos cada vez mais evidências de que existe certo contágio emocional entre as pessoas. Uma pessoa que mantém contato com um indivíduo deprimido tem maior tendência em ficar deprimida. Sabemos também que nosso estado de felicidade é um fenômeno que se dá em rede, ou seja, depende do grau de felicidade das pessoas com as quais estamos conectados.

Emoções positivas, o sorriso, o estado de felicidade, todos podem ser vistos do ponto de vista evolutivo como um mecanismo que facilita as relações sociais ao promover sentimentos prazerosos nas pessoas, recompensar os esforços dos outros e encorajar a continuidade da relação social. E o sucesso da espécie humana depende de sua capacidade de fazer relações sociais.

Podemos pensar na relação entre o senso de humor e saúde como um círculo virtuoso, onde há influências positivas nos dois sentidos. Um bom senso de humor está associado a uma maior autopercepção de saúde, maior capacidade de cooperar com a doença e a uma maior tendência a buscar assistência médica. Por outro lado, é preciso estar de bem com a saúde para que se tenha bom humor. E ainda há um outro lado dessa questão. Existem pessoas em que o feitiço vira contra o feiticeiro: o senso de humor pode servir como ferramenta para negação de sintomas e problemas de saúde.

Onde é que o riso se encontra no nosso cérebro?

As regiões mais frontais do nosso cérebro são consideradas as mais recentes no processo de evolução das espécies, e é aí que se concentram funções especializadas como a linguagem e o riso. O riso por sinal é exclusivo da espécie humana – a hiena não ri – e já foi demonstrado que a área cerebral que desencadeia o riso em última instância está nessa parte frontal. Já foi até comprovado que sua estimulação elétrica durante procedimentos cirúrgicos é capaz de desencadear o riso. Temos evidências também que o hipotálamo e as regiões temporais também têm participação na geração do riso. É claro que no mundo real precisamos do cérebro como um todo para entender a piada.

*Dr. Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp, professor do curso de medicina do Unieuro e neurologista do Instituto do Cérebro de Brasília.

Matéria originalmente no site do Correio Braziliense.
Crédito foto:
PEXELS / Elle Hugues

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