Banho de imersão em água gelada faz bem para a mente e o corpo?
Por Dr. Ricardo Afonso Teixeira*
Em 2022, tivemos o dia mais frio da história aqui no Distrito Federal. Os termômetros marcaram 1,4ºC e a sensação térmica ficou abaixo de zero. E não é que tinha gente nadando na Água Mineral? Essa temperatura hostil possivelmente traz algum bem-estar para esses nadadores. Sabemos que nessa hora tiveram maiores concentrações do hormônio cortisol e de neurotransmissores, como noradrenalina, dopamina e endorfina.
No ano de 2017, o jornalista e antropólogo americano Scott Carney publicou o livro What doesn´t kill us (O que não nos mata, em tradução livre), que foi muito bem recebido e fez parte da lista de best sellers do New York Times. Scott tinha um projeto de escrever um livro sobre falsos profetas quando teve conhecimento de Wim Hof, um guru holandês conhecido por Iceman (homem gelo) e logo pensou que ele poderia ser mais um candidato para compor os personagens de seu livro.
Hof é conhecido como homem gelo, pois preconiza o reencontro do homo sapiens com o ambiente natural sem o conforto a que estamos acostumados, e isso inclui enfrentar temperaturas geladas sem proteção térmica. O homem gelo defende que a prática de uma rotina de meditação no frio extremo promove a regulação do nosso sistema nervo autônomo, com benefícios ao estado mental, imunológico entre outros.
Scott foi atrás de Hof na Polônia e, até a publicação do livro, Scott já o estava seguindo há quatro anos. O que era para ele um possível charlatão passou a ser um guru. Entrou para o livro dos recordes subindo quase nu, junto a Hof e outros seguidores, o Kilimanjaro, a seis mil metros de altitude.
No livro, você pode encontrar estudos que avaliaram particularidades fisiológicas do corpo de Hof, como um contingente avantajado de gordura marrom. O tecido adiposo marrom é abundante em animais que hibernam, como os ursos, mas também existe entre os humanos e de forma bem mais expressiva nos recém-nascidos. Esse é um tecido que tem a capacidade de produção de calor para o organismo bem superior a qualquer outro tipo de tecido do corpo. E nos animais, é bem reconhecido que essa gordura varia nas diferentes épocas do ano por conta de mudanças de temperatura.
A onda Iceman está correndo o mundo e recentemente recebi pelas redes sociais uma prática de imersão em uma tina de gelo na Chapada dos Veadeiros. Temos algumas evidências de que a água gelada pode ter efeitos positivos para o humor e nos sistemas imunológico, endócrino e cardiovascular. Pode trazer riscos? Sim. Exposição prolongada a águas com temperaturas muito baixas pode levar a hipotermia, estresse cardíaco e arritmias. Cuidado especial deve ser tomado por aqueles com sabida patologia cardiovascular. Para os que não estão acostumados, um treinamento sob orientação profissional pode garantir mais segurança para ingressar nessa onda Iceman. Vale lembrar que o banho frio de chuveiro tem o seu lugar e pode até trazer benefícios semelhantes.
*Dr. Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp, professor do curso de medicina do Unieuro e neurologista do Instituto do Cérebro de Brasília.
Matéria originalmente no site do Correio Braziliense.
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