O uso do Tylenol durante a gravidez realmente tem relação com o autismo?

O Presidente Donald Trump sugere que as mulheres grávidas evitem o uso de Tylenol, por suposta relação ao risco de autismo, mas especialistas alertam que a fala é irresponsável e sem respaldo científico.

Na última semana Donald Trump fez uma declaração de que as mulheres grávidas deveriam aguentar o máximo possível antes de lançar mão do uso do Tylenol, pois a medicação pode fazer com que os bebês desenvolvam transtorno do espectro autista (TEA). Vale lembrar que o paracetamol, o Tylenol, é considerado a medicação antipirética e analgésica mais segura para as grávidas. Pode isso, Arnaldo?

Febre não controlada e infecções na gravidez têm sólida associação com TEA, então você já imaginou o tamanho da irresponsabilidade e do desserviço que este moço está fazendo. Mas de que cartola ele tirou esse coelho?

É consenso que o TEA é uma condição do neurodesenvolvimento complexa e multifatorial e tem associação com uma constelação de fatores genéticos e ambientais. A maioria dos casos de TEA pode ser ligada a causas genéticas e os fatores ambientais podem determinar como os genes vão se expressar. O fator ambiental mais fortemente estabelecido é a idade dos pais à época da concepção, maior idade, maior risco. Esse fator ambiental é na verdade genético também, já que à medida que envelhecemos acumulamos mais mutações genéticas que serão transmitidas aos filhos.

Outros fatores ambientais descritos são: parto prematuro ou por cesariana, diabetes gestacional, exposição na gravidez à poluição atmosférica e a algumas drogas antiepiléticas. Entretanto, não há evidências inequívocas de uma relação causa e efeito. E é esse o problema dos estudos frágeis que mostraram uma associação do uso de Tylenol na gravidez e risco de TEA nos filhos. O estudo mais robusto até o momento foi publicado pelo JAMA em 2024 e não confirma esta associação Tylenol- TEA.

Esse é um estudo sueco que envolveu 2.5 milhões de pessoas. A interpretação da tênue associação Tylenol- TEA demonstrada pelos estudos anteriores é a de que o aumento marginal do risco de TEA foi causado pelo processo infeccioso e não pelo uso da medicação. Nenhum desses estudos foi capaz de separar o efeito de infecções pré-natais do uso do Tylenol.

*Dr. Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e neurologista do Instituto do Cérebro de Brasília.
Crédito foto: PEXELS

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