Epidemiologia social: uma preciosa ferramenta para a saúde pública
Por Dr. Ricardo Afonso Teixeira*
Vivemos em rede desde os mais remotos tempos e o sucesso da espécie humana depende de sua capacidade em fazer relações sociais, capacidade que é vista como uma vantagem evolutiva. IndivÃduos no centro de uma rede social têm mais acesso à informação e, no caso dos nossos ancestrais, essa informação poderia ser, por exemplo, o local de uma nova fonte de alimento.
Entender melhor como funcionam as redes sociais permite-nos entender também como elas podem influenciar importantes problemas de saúde pública, área recente do conhecimento chamada de epidemiologia social. Nos últimos anos, riquÃssimos estudos nessa área vêm sendo publicados pelos pesquisadores americanos Fowler e Christakis, junto a outros colaboradores, nos mais renomados periódicos cientÃficos do mundo. Vejam só como os amigos têm influência em nossas vidas.
Os pesquisadores publicaram um estudo revelando que, numa epidemia infectocontagiosa, no caso, o vÃrus da gripe, indivÃduos mais ao centro da rede social são acometidos mais precocemente. Esse achado pode facilitar o controle de epidemias ao se focar os esforços precocemente em indivÃduos mais vulneráveis;
A rede social de um indivÃduo tem impacto no seu risco de tornar-se obeso em até três graus da rede (ex: amigo do amigo do amigo). Essa associação é muito mais forte pela proximidade social do que pela geográfica, como é o caso de vizinhos. A chance de uma pessoa se tornar obesa é 57% maior se um amigo se tornou obeso num dado perÃodo. Entre irmãos, a chance é 40% maior e no caso do cônjuge, a chance aumenta em 37%;
Esse mesmo efeito de contágio social existe na chance que uma pessoa tem de parar de fumar. Quando um dos membros de um casal para de fumar, o outro tem uma chance 67% maior de parar também. O indivÃduo tem 25% mais chances de parar quando um irmão/irmã também para, 36% mais chance quando um amigo para e 34% mais chance quando um colega de trabalho para;
O contágio social também exista na capacidade de uma pessoa se considerar feliz. Há uma tendência de pessoas felizes estarem no centro de suas redes sociais e próximas de outras com alto grau de felicidade, criando aglomerados de pessoas felizes. Além disso, ao longo do tempo, as pessoas ficam mais felizes quando passam a ser cercadas por outras felizes. Um amigo feliz que mora por perto (menos de 2 km) aumenta a chance de uma pessoa ser feliz em 25%, irmãos felizes por perto em 14%, e vizinhos em 34%. Esse efeito contagioso da felicidade diminui com o tempo e também com a distância entre as pessoas, e não é percebido entre colegas de trabalho. Também existe uma tendência do contágio social de sintomas depressivos entre amigos e vizinhos. O efeito parece ser mais marcante com amigas do que com amigos;
O mesmo fenômeno foi demonstrado quando o assunto é consumo de bebidas alcoólicas. A quantidade de álcool que uma pessoa consome é proporcional ao tanto que seus amigos e parentes próximos bebem. O padrão de consumo de álcool de vizinhos e colegas de trabalho não tem a mesma influência. Aqueles que não bebem têm menos amigos e parentes que não bebem;
*Dr. Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp, professor do curso de medicina do Unieuro e neurologista do Instituto do Cérebro de BrasÃlia.
Matéria originalmente no site do Correio Braziliense.
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