Neurônios-espelho nos permitem viver a vida dos outros

Quando você vê uma pessoa executando uma ação motora, áreas do seu cérebro responsáveis pela mesma ação são ativadas. Os neurônios-espelho são os responsáveis por esse fantástico fenômeno e a ação desses neurônios vão muito além de copiar experiências motoras.


Os neurônios-espelho foram descobertos meio sem querer por pesquisadores italianos ainda na década de 1990. Pela primeira vez constatou-se que a simples observação de ações dos outros era capaz de ativar as mesmas regiões do cérebro responsáveis pelo movimento do próprio observador. A percepção visual inicia uma espécie de simulação ou duplicação interna dos atos de outros. As mesmas regiões também são ativadas quando o próprio indivíduo executa a ação.

Sabe aquela situação em que o carro está parado num cruzamento, faz que vai, mas não vai, e o carro de trás já arrancou cheio de vontade e CRASH? Por outro lado, é mais fácil dirigir na estrada atrás de outro carro. Assistir a um jogo de tênis pode ser visto como um treinamento para quem pratica o esporte. São os comandos automáticos dos neurônios-espelho. Também são esses neurônios que explicam o que faz o bocejo ser tão contagiante.

Fazemos mentalmente tudo o que assistimos o outro fazer e o que a neurociência tem-nos mostrado é que isso vai muito além de movimentos. Neurônios-espelho foram encontrados nas áreas do córtex pré-motor e parietal inferior, associadas a movimento e percepção, bem como no lobo parietal posterior, no sulco temporal superior e na ínsula, regiões associadas à nossa capacidade de compreender o sentimento de outra pessoa, entender a intenção e usar a linguagem.

O cérebro entende através dos neurônios-espelho até mesmo a intenção de uma ação. Uma série de neurônios é disparada ao olharmos para uma imagem de uma mesa bem arrumada e uma mão pegando uma xícara – com a provável intenção de beber o café. Um diferente grupo de neurônios é disparado quando olhamos para a mesma cena da mão pegando a xícara, mas numa mesa desarrumada – com a provável intenção de lavar a xícara.  Sentir nojo ou ver uma pessoa com olhar repulsivo de nojo faz com que neurônios-espelho das mesmas regiões do cérebro sejam estimulados.

Dessa forma, neurônios-espelho têm papel essencial na percepção de intenções e na experiência da empatia. É o outro entrando em nosso cérebro – empatia origina-se da palavra grega empátheia, que significa “entrar no sentimento”. Não há muita dúvida de que os neurônios-espelho foram cruciais no desenvolvimento de nossas habilidades sociais através de avanços na comunicação e aprendizado. Com eles a informação é espalhada e amplificada colaborando para a promoção da cultura. Alguns cientistas chegam a chamar esses neurônios de DNA da neurociência.

Você deve estar se perguntando se na leitura de um romance os neurônios-espelho também estão a pelo vapor? A resposta é sim e já temos boas evidências de que eles fazem a gente viver na carne, melhor dizendo, no cérebro, a vida dos personagens. Nós compreendemos o personagem porque temos dentro de nós a mesma experiência. O conteúdo de um livro pode ativar circuitos neuronais da mesma forma que estímulos sensoriais, como a visão de uma ação do outro. A literatura coloca em ação partes do cérebro que vão fazer o leitor experimentar, no próprio cérebro, as sensações físicas e emocionais como num filme mais do que 3D; um superfilme que ativa infinitas dimensões. E é claro que quando falamos de cinema, nem é preciso apontar o quanto vivemos a vida de quem está na tela.

Confira o áudio da coluna Cuca Legal, uma parceria do ICB com a Rádio CBN Brasília:

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