O ser humano é altruísta por natureza

Pesquisas nos mostram que o ser humano tem sim uma tendência inata de cooperação. E é claro que a máxima de Jean-Jacques Rousseau ainda é válida: “o ser humano nasce bom, a sociedade o corrompe”.


A resposta é sim e já começa na infância. Crianças entre 7 e 8 anos de idade já são capazes de dividir seu alimento de forma igualitária com parceiros do mesmo grupo social (coleguinhas de escola), mesmo quando têm a chance de ficar com a maior parte. A isso se dá o nome de altruísmo “extra-paroquial”, a capacidade de criar e manter laços de cooperação com indivíduos que não são de seu mesmo núcleo familiar e é uma das mais marcantes habilidades do ser humano e não encontrada em outras espécies. Crianças ainda apresentaram aversão a situações em que a divisão é feita com desigualdade e o altruísmo é independente do efeito reputação, ou seja, não fazem o bem porque tem gente olhando e porque a ação poderia trazer benefícios futuros.

O altruísmo nos deixa mais feliz
Pesquisas que analisam atitudes no dia a dia que promovem uma maior satisfação com a vida, apontam que o altruísmo junto ao otimismo e a gratidão são fortes alavancas para termos uma vida feliz.

A jornalista Emily Esfahani Smith, autora do livro Power of a Meaning, Editora Crown, New York, chama nossa atenção para que nossa vida seja cheia de sentido, e não simplesmente cheia de felicidade.

Ser feliz? Todo mundo quer, mas será que a missão de encontrar a felicidade, fortemente estimulada pela indústria da autoajuda, não tem deixado as pessoas mais vazias, infelizes? Ela propõe que desviemos o foco da felicidade para uma vida cheia de sentido, vida dedicada a algo maior do que o eu. Um dos passos fundamentais para a publicação do livro foi seu artigo escrito em 2013 na revista americana The Atlantic : Há muito mais para a vida do que ser feliz. Esfahani provoca a reflexão de que a empreitada de encontrar a felicidade traz consigo um modelo de retirada. Isso é diferente no caso da busca por uma vida que faça sentido em que o pilar mais forte é a doação, o altruísmo.

Existem falsos substitutos para esse sentido, criando uma sociedade com um vácuo existencial. A tecnologia nos ajuda e ajudará muito mais, mas ela também tem seu lado negro. Para termos uma vida com sentido precisamos ser conscientes e presentes. Difícil imaginar isso nutrindo a mente e o cérebro com estímulos a conta-gotas que prevalecem nas plataformas das redes sociais. A felicidade é uma condição fluida, efêmera. A percepção de sentido na vida é duradoura.

A prestigiada revista Nature Communication publicou um estudo que mostra como ações altruístas estimulam regiões do nosso cérebro que conectam o efeito do altruísmo (região temporo-parietal) à nossa percepção de felicidade (estriado ventral). Maiores ou menores doses de altruísmo não fizeram diferença no tanto que as pessoas ficavam felizes. Mais interessante foi que a simples intenção de se doar ao outro já foi capaz de ativar essa conexão. Altruísmo dá um “barato” que também é conhecido pelos neurocientistas como “warm glow”, ou brilho quente. Outras pesquisas já demonstraram que esse barato é mais duradouro para quem dá do que para quem recebe. O interessante é que essa sensação vem acompanhada de redução de atividade das amígdalas, regiões do cérebro associadas ao medo, luta ou fuga e isso acontece de forma mais robusta quando podemos identificar a pessoa que recebe. Menor atividade das amígdalas significa menores níveis do hormônio do estresse cortisol e uma série de potencias benefícios à saúde física e mental. E temos uma série de estudos que apontam uma maior sobrevida entre as pessoas que fazem trabalhos voluntários.

*Dr. Ricardo Teixeira é neurologista e diretor clínico do Instituto do Cérebro de Brasília

 

 

Confira o áudio da coluna Cuca Legal, uma parceria do ICB com a Rádio CBN Brasília:

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